INTRODUÇÃO: A triagem neonatal (TN) para Fibrose Cística (FC), bem como os avanços no diagnóstico e no tratamento, têm contribuído para prevenção de óbitos por essa doença. No Brasil, as mortes antes do 1º ano de vida, correspondem a 90% dos óbitos em menores de 5 anos, sendo os óbitos pós-neonatais responsáveis por aproximadamente 44% desses. Entre as crianças com TN positiva para FC, continuam a ocorrer óbitos antes da conclusão da investigação diagnóstica. Estudar as causas desses óbitos pode possibilitar a adoção de medidas para evitar esse desfecho fatal.
OBJETIVO: Analisar as causas de óbitos em crianças com TN alterada para FC, sem conclusão do diagnóstico dessa doença, em um estado do Nordeste do Brasil.
METODOLOGIA: Trata-se de uma série de casos, com dados secundários obtidos do serviço de referência em triagem neonatal do estado e do banco de informação de óbitos. Incluiu-se todos os lactentes que obtiveram, pelo menos, um teste de tripsinogênio imunorreativo (TIR) positivo na TN para FC entre 2013 e 2017 e que evoluíram para óbito antes da finalização de todas as etapas da investigação para a doença.
RESULTADOS: Incluídas 138 crianças, das quais, 93 (67.4%) tiveram elevação da primeira dosagem da TIR (TIR1) e faleceram antes de serem submetidas à segunda TIR (TIR2). Quarenta e cinco (32,6%) crianças foram submetidas aos dois exames (TIR1 e TIR2), 34/45 (75,6%) com TIR2 elevada. Quatro RN foram submetidos a um teste do suor, com o exame alterado em um deles. Obteve-se a idade do óbito em 96 (69,6%) casos, mediana (IIQ) de idade de 34,5 (17,8 – 58,0) dias, sendo que 57 (59,4%) óbitos ocorreram entre 28 e 364 dias de vida. Entre os 138 lactentes que tiveram a TIR1 elevada, 24 (5,8%) tiveram alteração em outros testes da TN: 12 com alterações no perfil de aminoácidos, 5 com alteração na eletroforese de hemoglobinas, 5 alterações na 17-hidroxi-progesterona e 1 na dosagem do TSH. Obteve-se as declarações de óbitos de 21 (61,7%) crianças dentre as 34 crianças com TIR1 e TIR2 elevadas. A mediana (IIQ) da idade do óbito foi 42 (30 - 55) dias, com mediana (IIQ) do tempo entre o resultado do TIR2 e o óbito de 10 (4 – 28 dias) dias. Todos os 21 óbitos ocorreram em ambiente hospitalar. Nesse subgrupo, as principais causas de óbito foram quadros infecciosos (47%), malformações congênitas (19%) e cardiopatias (15%). Entre as causas infecciosas, a septicemia esteve presente em 44% desses quadros, seguida por pneumonia (13%).
CONCLUSÃO: O presente estudo demonstrou as dificuldades na conclusão do protocolo da TN para FC nessa população. Houve elevada frequência de doenças infecciosas entre as causas dos óbitos. A TN positiva para FC deve alertar os profissionais de saúde para a possibilidade real de uma doença metabólica de difícil manejo, objetivando otimizar o diagnóstico definitivo, o que pode evitar principalmente a ocorrência de óbitos pós-neonatais.