O texto aqui apresentado representa um esforço de compreensão da literatura distópica a partir de um viés marxiano e lukaciano. A partir da obra 1984, de George Orwell, procura-se analisar os elementos relativos ao estranhamento a partir das constatações de Marx e das reflexões de Lukács a respeito da literatura. O estranhamento é uma categoria central para o pensamento marxiano e, mesmo, para a melhor compreensão de Lukács. Assim, este texto procura revisar os pontos centrais do romance como literatura essencialmente burguesa, mas, fundamentalmente, apontar que o tipo de texto que se caracteriza como distópico pode se apresentar como uma denúncia da decadência ideológica. Neste caso, a partir do momento em que a burguesia, assumindo o controle econômico e político da sociedade, recua em seus propósitos revolucionários, passa a um posicionamento conservador da ordem social. Essa posição conservadora reflete-se, de maneira importante, na produção ideológica, que passa a ser justificadora e naturalizadora da ordem social capitalista burguesa. A negação da distopia se apresenta precisamente nos marcos do aprofundamento do estranhamento que a decadência ideológica provoca. Ao levar a um limite extremo as consequências do estranhamento, Orwell (2015) expõe as contradições não só do Stalinismo, objeto direto da crítica do livro que foi aqui tomado como base, mas também do objeto indireto de sua crítica, que é a própria sociedade baseada na contradição entre capital e trabalho.