Duas Alices. Uma segue um coelho e cai em um buraco que parece não ter fim,
entra em um mundo outro, fora de controle, fora de contexto, um mundo nunca visto igual. A
outra não cai em lugar algum, ela apenas existe no mundo. Neste mundo. Mundo sob
controle? Dentro do contexto? Aparentemente sim. Mas Alice tem apenas dez anos, o que ela
saberia do controle e do contexto do mundo, além da referência daqueles que mais velhos e
supostamente mais sábios dão a ela? Mas para os adultos que a circundam o mundo não está
sob controle, suas próprias vidas não estão. Alice, muito longe de ser ingênua sabe disso, e
assim, seu mundo se torna confuso, ou melhor, é tornado confuso pela complexidade das
relações dos adultos a que ela deve se submeter. As Alices com seus pequenos corpos imersos
nestes mundos descontrolados, transformam sua situação problemática em situação lúdica, em
jogo, em brincadeira, com a facilidade de fazer esse tipo de reversão que só as crianças e os
ditos loucos têm. Assim, Alice e Alice faz uma intercessão entre essas duas personagens de
mundos distantes, mas ao mesmo tempo próximos. Uma Alice literatura, a outra cinema. Uma
Lewis Carroll, a outra Wim Wenders. Este ensaio investiga a relação tanto no que diz respeito
às aproximações quanto às discrepâncias entre as duas formas de linguagem, mas
principalmente, e também a relação entre o estado das duas meninas. Partindo do pensamento
de Deleuze sobre a reversão do pensamento cartesiano feito através da análise do livro de
Carroll, se estará refletindo sobre as situações vividas pela Alice de Wenders e considerando a
possibilidade de que também a vida real pode ser repleta de paradoxos, jogos e situações que
escapam à lógica.